Notas técnicas

deFEMde trata violência de gênero nas escolas de SP

1024 724 Rede Feminista de Juristas

Em setembro de 2021, a Coordenação Pedagógica de uma escola na região de Embu das Artes orientou os professores a solicitar aos pais que fiscalizassem as roupas de seus filhos para ir à escola. No comunicado, a coordenação descreveu “blusas e ou calças cheias de recortes, que deixam o corpo à mostra” e acrescentou: “estamos em ambiente escolar, cujo foco são os estudos“, acrescentando que estudantes usando roupas como as descritas teriam pais, mães e responsáveis convocados.

A Rede Feminista de Juristas – deFEMde oficiou a Secretaria da Educação de SP, a Diretoria regional de Ensino em Taboão da Serra e a escola em questão, em novembro de 2021, e reiterou a comunicação em janeiro de 2022; novo silêncio ensejará as medidas cabíveis.

Ao inferir que jovens estão com o corpo à mostra, sinalizamos que estão emitindo convites a terceiros para escrutínio, sexualizações e violências, algo que não pode ter lugar no contexto educacional. Colocamos um alvo para violência sexual em cada jovem que usa estas roupas. O entendimento implícito sobre tamanhos de roupas, decotes, saias ou “blusas e ou calças cheias de recortes, que deixam o corpo à mostra” infere disponibilidade de corpos para o assédio ou importunação sexual, e é justificação comum para objetificar, invalidar, diminuir, deslegitimar e silenciar meninas e mulheres. Falamos de ferramenta essencial de manutenção da cultura do estupro, ou seja, de naturalização de violências sobre corpos femininos, em sua faceta mais cruel: a culpabilização feminina.

Dentro desta estrutura, para meninas e jovens, é dever usar roupas que não chamem a atenção dos homens, pois se algo lhe acontecer a culpa será dela, que “provocou” usando vestimentas tidas como “inadequadas”. É dever de meninas e jovens não engravidar, e não exercer a sexualidade sobre seus próprios corpos – a gravidez é, neste ponto, mecanismo de punição para meninas e mulheres pelo exercício desta sexualidade, pelo controle de seus corpos e desejos.
Para além das posturas de culpabilização feminina, o ambiente escolar pode reproduzir padrões discriminatórios quando professores relacionam o rendimento de alunas ao esforço e ao bom comportamento, e não como real potencial de genialidade, liderança e crescimento.

Não existe apenas a desigualdade entre o sexo masculino e feminino, existe também a desigualdade de tratamento dos padrões de comportamento esperados e aceitos socialmente por homens e mulheres. No ambiente escolar, a diversidade tem um custo altíssimo a ser pago por crianças e adolescentes, impingido por aqueles que deveriam promover o respeito e celebrar a diferença. 

Este é um mecanismo perverso de desumanização, que falha em reconhecer o respeito como imperativo de conduta e impõe o desconforto e a vergonha do próprio corpo como padrões sociais de positividade. O último lugar onde meninas e jovens devem ser violadas e violentadas desta forma é no ambiente escolar. A conduta vai além do reprovável. Beira a criminalidade, e exige providências imediatas no sentido de se repensar a estrutura de ensino na unidade de ensino em si e na região, tendo como baliza a estrutura constitucional e legal de educação.

Confira a íntegra do ofício aqui.

deFEMde discute racismo institucional na OAB SP

800 450 Rede Feminista de Juristas

Na 2.478ª Sessão Ordinária do Conselho Seccional da OAB SP, ocorrida em 27/09/2021, o Conselheiro Seccional Celso Fernando Gioia afirmou que a desigualdade racial é “relegada a poucos casos, que têm baixa relevância para a coletividade“. 

Tal declaração foi dada em contexto de apreciação da alteração do Regimento Interno da OAB SP para tornar permanente a Comissão de Igualdade Racial da Seccional. Lamentamos constatar manifestação tão grotesca do racismo institucional no ambiente da OAB,  que constitucionalmente tem o dever de erradicar estas práticas de seu cotidiano.

Gostaríamos de celebrar este momento histórico; mas não vemos os trabalhos de 27/09/2021 com bons agouros. O reconhecimento do status permanente da Comissão é luta longeva da advocacia negra paulista, e consta expressamente da Epítome pela Equidade Racial, documento redigido pela advocacia negra na Capital, na região metropolitana, no litoral e no interior do Estado, com 30 reivindicações da advocacia negra em seis eixos de trabalho para o combate ao racismo no meio jurídico.

O referido documento trata a desigualdade como ela é: estrutural, institucional e interpessoal. Para além, requer um compromisso firme da instituição que representa esta dita advocacia no combate às estruturas discriminatórias, considerando, principalmente, o papel constitucional de indispensabilidade à administração da Justiça desempenhado pela Advocacia.

Com racismo, não há Democracia; sem democracia, não há Cidadania; sem cidadania, não há Justiça. E quando a defesa do Estado Democrático de Direito que compreende a defesa intransigente dos Direitos Humanos não alcança todas as pessoas, não há que se entender pela construção da Democracia. 

É dever constitucional da OAB SP firmar e cumprir cabalmente o compromisso antirracista, ainda mais quando o tema já foi objeto de proposta pela advocacia negra – que está regularmente inscrita e quite na Seccional e deve ser ouvida e respeitada.

Confira íntegra da nota técnica aqui.

deFEMde repudia sentença da justiça militar de SP

1024 563 Rede Feminista de Juristas

Em 2019, uma jovem pediu ajuda à Polícia Militar depois uma tentativa de assalto, acreditando estar segura na presença dos policiais. “Conte sempre com a Polícia Militar”, é o mote da corporação; mas para esta jovem, a segurança esperada caiu por terra. Ela foi estuprada dentro da viatura, após aceitar uma carona dos agentes até a rodoviária, em Praia Grande.

Afirmar a existência da violência sexual é possível e plausível. Sêmen foi encontrado na viatura, que estava em movimento e com giroflex ligado. O celular da jovem também foi achado no carro. Laudos apontam para a violência sexual. Ela existiu, e não há como discutir, ou ignorar isso.

No entanto, foi o que ocorreu; o juiz Ronaldo Roth, da 1ª Auditoria Militar de São Paulo, absolveu os agentes policiais do crime, afirmando que a vítima “nada fez para se ver livre da situação“, e que “não reagiu“. Para o magistrado, não houve violência, porque a vítima não lutou com seus agressores, policiais militares armados que, segundo a sentença, “não apresentavam perigo“. Ele absolveu os PMs da acusação de estupro, pois entendeu que, neste caso, o sexo foi consensual.


A decisão de 8 de junho de 2021 se junta ao rol de absurdos como aquele prolatado pela 5ª Vara Criminal de Campinas, que insinuou a existência de um “estereótipo de bandido” em pessoas negras, e ao julgado da 3ª Vara Criminal de Florianópolis, que não contente em assistir ao assédio da vítima pelo defensor do Réu, concluiu pela absolvição afirmando inexistir prova de vulnerabilidade da vítima.

O Brasil já assistiu a shows de horrores similares, com consequências catastróficas. Não há Justiça onde a função judicante é exercida com parcialidade. Não há futuro quando a Justiça que deveria impulsionar o progresso só sabe reproduzir retrocessos. A decisão proferida caracteriza estarrecedora chancela à cultura do estupro. E a Rede Feminista de Juristas – deFEMde repudia veementemente documentos jurídicos como este, incompatíveis com o Estado Democrático de Direito.

Confira íntegra de nossa nota técnica aqui.

deFEMde trata posicionamento da OAB sobre paridade de gênero e cotas raciais

1024 718 Rede Feminista de Juristas

A Rede Feminista de Juristas – deFEMde emitiu nota técnica examinando o teor de Colégio de Presidentes da OAB, que debateu a aprovação do Projeto Valentina e a aplicabilidade de ações afirmativas para participação da advocacia negra no sistema OAB, criticando a falta de transparência nos procedimentos, o silêncio nas seccionais sobre as temáticas e as justificativas apresentadas em sessão para entraves ao projeto.

No que tange a representatividade das mulheres e pessoas negras, indígenas e não-brancas na advocacia, entendemos necessária a reflexão. 

Quando práticas de inclusão em órgão que tem uma função constitucional tão relevante como a OAB precisam de um voto de minerva para serem aprovadas, é sinal de que há muito a se avançar nos debates de gênero e racialidades no Brasil. 

Esperamos que a sessão do Conselho Federal, em princípio marcada para 14/12/2020, não reflita as dificuldades expostas no Colégio de Presidentes, e que consiga corrigir, ao menos em parte, os problemas apontados. 

Esperamos que esta sessão confirme a paridade de gênero aprovada, com aplicação já nas eleições de 2021, e que aprove as cotas raciais nas proporções propostas pela Conselheira Federal por São Paulo, Daniela Libório. Sem redução, com transição.

Confira a íntegra da nota aqui.

deFEMde repudia perseguição da adoção de ações afirmativas empresariais

1024 683 Rede Feminista de Juristas

A Rede Feminista de Juristas – deFEMde manifesta seu REPÚDIO à tese do Defensor Público Federal JOVINO BENTO JÚNIOR que, em Ação Civil Pública, busca condenação de empresa nacional pela adoção de ação afirmativa de reserva de contratação destinada a candidates negres.

A Defensoria Pública é uma instituição essencial para a democracia do país, promovendo efetivo acesso à justiça às populações marginalizadas econômica e socialmente. Hoje, é uma das instituições judiciárias que mais sofre com a carga exorbitante de trabalho que pesa sobre servidores e servidoras que a integram, com orçamentos exíguos e dificuldade de implementar projetos.

É aterrador que um funcionário público vinculado a uma instituição de tamanha relevância e com tanto trabalho sério a ser realizado opte – ainda que sob a proteção da independência funcional – por gastar tempo e recursos públicos para a produção de uma tese juridicamente incabível e socialmente perversa.

A reserva de contratação para pessoas negras está em conformidade com a Constituição Federal, com o Estatuto da Igualdade Racial e com a Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial, da qual o Brasil é signatário. 

Não bastasse, o Supremo Tribunal Federal já validou, por duas vezes, a constitucionalidade de ações afirmativas, e o Ministério Público do Trabalho emitiu, em duas oportunidades diversas, notas técnicas positivando tais ações. O próprio órgão ao qual este funcionário público serve repudiou e condenou, publicamente, sua postura.

Como um todo, o ordenamento jurídico pátrio entende pela necessidade de reverter um quadro inaceitável de exclusão de pessoas negras do mercado de trabalho, principalmente quando se trata de cargos de decisão e melhor remunerados. 

Perpetuar falácias culturais e estimular práticas discriminatórias é mais uma das muitas ferramentas usadas na perversa roda estrutural do racismo – que não pode ser reversa, como bem já explicou João Moreira Pessoa de Azambuja.

Isso porque a discriminação racial não se resume à raça ou etnia: é estruturante e estrutural da formação de nossa sociedade, tendo como alvo primário as populações negras e indígenas, que foram sistematicamente escravizadas, torturadas, assassinadas, marginalizadas e subalternizadas, em todos os escopos e setores funcionais da sociedade brasileira. 

Confira a íntegra da nota aqui.

deFEMde repudia discriminação legislativa contra atletas transexuais

1024 683 Rede Feminista de Juristas

A Rede Feminista de Juristas – deFEMde se posiciona contra a aprovação do Projeto de Lei nº 346, de 2019, que busca impedir que atletas transexuais possam competir em partidas esportivas oficiais no Estado nas modalidades que correspondem às suas identidades de gênero. 

O projeto é altamente problemático porque visa a impor uma postura discriminatória, amparando-se em supostas motivações científicas. Ressaltamos que, na justificativa do projeto, são citadas escassas referências, apesar de, atualmente, haver um intenso debate sobre o tema na esfera científica. Também não se contempla qualquer reflexão sobre o ponto de vista da garantia de direitos e da observância ao princípio da igualdade e não discriminação. 

Em total desacordo com normas de direitos humanos, o projeto contribui para o fortalecimento da narrativa que deseja preservar e impor processos de marginalização e exclusão às pessoas transgêneros nas mais diversas esferas da vida social. 

Considerando que debates e estudos sobre a inclusão de pessoas trans nos esportes estão em desenvolvimento pelas instâncias esportivas, com vistas à elaboração de arranjos justos para todo o corpo de atletas, a iniciativa deixa de apresentar qualquer motivo válido para que se aprove esse tipo de regulamentação discriminatória. 

deFEMde apoia transporte público gratuito para mulheres em situação de violência

1024 683 Rede Feminista de Juristas

Nos últimos anos, no âmbito federal, diversas tentativas de modificação da Lei Maria da Penha têm sido objeto de discussão, mas poucas delas têm a capacidade de gerar real impacto na vida das mulheres, já que não enfocam em fortalecer a rede de serviços de atenção e atendimento à mulher em situação de violência – a qual, se robusta, multidisciplinar e orientada por noções de direitos humanos das mulheres, pode ser decisiva ao propiciar condições para que mulheres encontrem caminhos para sair do ciclo da violência doméstica e/ou intrafamiliar. 

Embora seja fundamental que haja a coordenação, a formulação e a execução de políticas públicas em âmbito federal, é certo que Poderes Municipais também podem se mobilizar para contribuir para o aperfeiçoamento da rede. Um ótimo exemplo desse tipo de iniciativa é a proposta presente no Projeto de Lei Municipal (São Paulo) nº 01-00124/2017, que estabelece, no âmbito do Município de São Paulo, às mulheres que tenham sido vítimas de violência, o direito a ficarem temporariamente dispensadas do pagamento de tarifa no transporte público municipal. 

É sabido que, em muitos casos, a situação de violência doméstica e/ou intrafamiliar atua como um vetor de vulnerabilidade, afetando drasticamente a vida das mulheres e o exercício de seus direitos. Medidas que visam a reconectar as mulheres com espaços de sociabilidade e impulsionam o aprofundamento ou reconstrução de sua autonomia são fundamentais. Por isso, é mais que desejado pensar em novas formas de tornar o mundo um lugar mais acolhedor para mulheres em situação de violência. 

Em uma cidade da magnitude de São Paulo, propiciar melhor mobilidade pode ser fundamental para facilitar o acesso a serviços da rede de apoio, o acesso à justiça e o acesso a oportunidades de trabalho, educação, cultura e lazer, especialmente para mulheres que se encontram em situação de dependência econômica. 

É por tais motivos que a Rede Feminista de Juristas, por meio desta nota, manifesta seu apoio à aprovação e sanção do projeto de lei.

deFEMde repudia limitação ao direito de escolha da parturiente

1024 768 Rede Feminista de Juristas

A Rede Feminista de Juristas – deFEMde vem a público manifestar repúdio à proposição legislativa n. 435/2019 , de autoria da Deputada Estadual de São Paulo Janaína Paschoal, por entender que o projeto enfraquece o paradigma da tomada de decisão consciente e falha em promover o direito de gestantes e parturientes às melhores práticas de saúde.
Preocupa-nos, sobretudo, que sua tramitação seja feita às pressas e à revelia da participação das mulheres, deixando de ouvir as principais interessadas e afetadas no assunto – o que fere não apenas as melhores práticas da democracia, como também a integridade do processo legislativo.
Cabe lembrar, primeiramente, que o Estado de São Paulo já possui uma legislação dedicada ao tema. Criada em 2015, pela Assembleia legislativa do estado de São Paulo, ela prevê o direito à assistência médica humanizada, o acesso a informações sobre os métodos e procedimentos eletivos e a proteção da vontade e da tomada de decisão consciente das gestantes.
A Lei 15.759/2015 , construída a partir das vozes de mães, profissionais da saúde e estudiosas da área, institui uma série de direitos às gestantes e deveres aos profissionais de saúde que atuam junto aos serviços públicos que já visam a solucionar os problemas da condição da gestante e parturiente nos equipamentos de saúde.
A existência dessa lei nos faz questionar: por que se faz necessária uma nova lei para proteger um direito já previsto pela legislação atual, que, aliás, sequer é citada no projeto de lei em questão?
Não são poucos os indícios que nos induzem a levantar a hipótese de que, à semelhança de projetos de lei meramente populistas, pouco técnicos e com baixa condição de gerar impacto social, a intenção real por trás do projeto não é solucionar problemas das gestantes e parturientes brasileiras (que, de fato, existem!), senão encampar uma proposta manifestamente ideológica, que ataca àquelas que lutam por novas formas de enxergar o parto e a maternidade.
Um desses indícios é o fato de que o diagnóstico que serve de premissa ao projeto é equivocado: diferentemente da narrativa ali insculpida, dados de agências oficiais demonstram que a cirurgia cesariana já é amplamente e majoritariamente adotada como prática médica no Brasil.

Confira a íntegra da nota aqui.

deFEMde se manifesta por diversidade e inclusão nas escolas

1024 724 Rede Feminista de Juristas

A Rede Feminista de Juristas – deFEMde elaborou nota técnica analisando em profundidade o Projeto de Lei nº 7180/2014, em tramitação na Câmara dos Deputados, bem como seu respectivo Substitutivo. Ambos pretendem modificar a Lei nº 9.394/96, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, para restringir o exercício da profissão docente, em nome de uma suposta ampliação da proteção de convicções e valores pessoais e familiares.
As propostas pretendem alterar a LDB para incluir, entre seus princípios, “o respeito às convicções do aluno, de seus pais ou responsáveis, dando precedência aos valores de ordem familiar sobre a educação escolar nos aspectos relacionados à educação moral, sexual e religiosa”, estabelecendo uma série de regras a serem observadas pelos docentes e introduzindo novas diretrizes para as instituições educacionais, modificando radicalmente a noção democrática de educação prevista em nossa Constituição.
O estudo faz uma análise de constitucionalidade e convencionalidade do projeto de lei e de seu substitutivo e busca compreender possíveis efeitos do Projeto sobre a realidade social brasileira; considerando as avaliações feitas, a deFEMde se manifesta pela não aprovação do Projeto de Lei no 7180/2014 e seu substitutivo pelas Casas Legislativas, por compreender que suas disposições não estão de acordo com a Constituição Federal e tampouco com as normas infraconstitucionais e supralegais brasileiras e, ainda, que sua aprovação representaria profundo retrocesso no campo das políticas educacionais.

Confira íntegra da nota aqui.

deFEMde trata proposta da câmara sobre concessão de protetivas em delegacia

1024 762 Rede Feminista de Juristas

A Rede Feminista de Juristas – deFEMde emitiu nota técnica tratando o PLC nº 94/2018, que tenciona conceder a delegados e delegadas a competência para decidir sobre a concessão ou não de medidas protetivas a vítimas de violência doméstica.

Apesar de a proposta ter como objetivo, aparentemente, dar uma resposta a algumas das dificuldades apontadas por pessoas em situação de violência, em especial ao problema do tempo de demora para a efetivação das medidas protetivas de urgência, a Rede Feminista de Juristas – deFEMde constatou diversos pontos problemáticos no ato normativo, cuja aplicação pode culminar num cenário de maior desproteção dessas pessoas.

O PLC possui patente inconstitucionalidade por ofender o princípio da separação de poderes, uma vez que confere a um órgão do Poder Executivo uma competência que deveria ser somente jurisdicional. O texto constitucional não confere à polícia a função decisória, tampouco cautelar. Tal alteração poderá enfraquecer os efeitos da Lei Maria da Penha e causar insegurança jurídica às pessoas que tiveram suas medidas protetivas deferidas inconstitucionalmente por delegacia de polícia.

O projeto também desconsidera todo o histórico de construção e a estrutura da política estatal de enfrentamento à violência doméstica, além de falhar em elaborar um diagnóstico correto dos problemas que marcam essa política. Atribuir essa capacidade decisória à autoridade policial também desvirtua outros aspectos da Lei Maria da Penha, que é um olhar integral para a violência, a motivada aposta no atendimento multidisciplinar e a recusa dos mecanismos punitivos como única ferramenta à disposição das pessoas. Essa eventual modificação fere essas diretrizes ao descaracterizar o papel das autoridades policiais e desconsiderar aquele que deve ser desenvolvido por outros atores da rede de atendimento.

Essa medida pode levar ao aprofundamento da desproteção das pessoas, expondo-as a violências institucionais. E se desacompanhada de investimentos, essa medida pode se traduzir em precarização do trabalho policial. Em muitos locais, a polícia opera abaixo da capacidade estimada como ideal. Esses dois aspectos estão interligados – o sucateamento e a precariedade das condições de trabalho nas delegacias afetam diretamente a maior vítima dessa situação: as pessoas que dependem de atendimento de qualidade como mecanismo de efetivação de sua cidadania.

A ausência de legitimidade popular no Projeto de Lei sob análise muito preocupa, uma vez que não parece estar atendendo às demandas das mulheres em situação de violência doméstica e sim a interesses de categorias específicas.

Confira a nota técnica aqui.